16 de novembro de 2006

O FENÔMENO

Uma livraria é deveras um local agradabilíssimo. Notória é a satisfação que sinto quando caminho por algumas delas. Um ambiente que transcende cultura, exala sabedoria, desprende o raciocínio. Os passeios nas livrarias deveriam ocorrer entre famílias, como se fora um domingo na praia, com crianças montando castelinhos de livros e o pai se espreguiçando num dos sofás das salas de leitura.

Eis que nos últimos tempos, venho notado um fenômeno entre os títulos expostos nas prateleiras. Há um assunto em comum, cogente entre as novas obras literárias. Todas vindouras do fenômeno que se compreendeu o “Código da Vinci”. Eis que nesses tempos, tal obra tornou-se a vedete nas bibliotecas particulares, nas mãos dos usuários de ônibus e metrôs. Fato esse que me causou uma exclamação: “O brasileiro está finalmente lendo!”.

Fui buscar compreender o fato, e cheguei a um senso comum: A questão não é o brasileiro que está reaprendendo a ler, mas sim a possibilidade da destruição de um mito é que fascina qualquer ser humano. Eis onde pretendo chegar. O “Código da Vinci” não é um fenômeno apenas por ser uma obra literária relativamente boa, mas sim porque trata de açoitar a imagem de Jesus Cristo.

Sim, meu caro leitor, cá estou eu novamente falando dele. Não poderia ser tão diferente. Jesus Cristo é um sucesso mercadológico nababesco. Tudo o que se refere, ou pretende se referir a ele, é um best seller nato e hereditário. Mas o “Código” procurou um oposto. Destrinchou a obra de Leonardo da Vinci e buscou nela as manchas do passado obscuro de Cristo. Esse assunto somado a uma linguagem pretensamente científica foram o suficiente para embalsamar o produto entre os mais vendidos no mundo.

Há muito que o cristianismo se tornou um negócio amplamente vantajoso. O temor humano, suas crises e misérias são demanda para todo esse business, pois a crença em um salvador, um messias redentor é a esperança que muitos (milhões) se agarram para não saltarem do oitavo andar. Mas eis a constatação: o cristianismo de hoje nada tem a ver com Jesus Cristo. Ele foi um grande líder, um sindicalista de Jerusalém, um sem-terra nazareno. O que Cristo pregou na sua passagem terrena resume-se na solidariedade humana e na igualdade entre os povos. Os adendos bíblicos foram criados pelos evangelistas e disseminados pelo mundo. Atribuíram a ele alguns milagres e foi o bastante para que ele fosse aclamado como o “salvador”.

Vejam bem, meus caros, não discordo da possibilidade de que Cristo tenha sido um paranormal, um espiritualista. O fato que realmente contribuiu para o crescimento do cristianismo e a seqüente destruição de sua essência foi a ganância humana. Sim, desde vivo, Jesus atraia multidões. Seus discípulos enxergaram naquilo um grande negócio, uma forma de se locupletar da crença do povo. E assim, fundaram a igreja e se propuseram a dar prosseguimento ao discurso de Cristo. Conseguiram assim o subsídio do povo com a promessa de que “Ele voltará”.

Nesses nossos dias observamos toda a veemência dos pastores evangélicos, todo o discurso sutilmente persuasivo dos padres. Porém todos são apenas filósofos que encontraram na religiosidade uma forma de se sustentarem com sua retórica. Minha crítica não vai para os fiéis seguidores cristãos. Em absoluto. Eles são vítimas. Mas sim, vai para os padres de passeata, para os políticos coroinhas. E caminhando mais a fundo, essas palavras vão para os responsáveis por dois milênios de repressão sexual (sobretudo o feminino, pois as prostitutas não pagam impostos), vão também para os defensores da hipocrisia dos casamentos, para aqueles que pregam o sacrifício em busca do reino dos céus. E claro, não podiam faltar os mais abjetos: aqueles que cobram dízimos obrigatórios sob a ameaça de uma condenação eterna.

Vejam que é minha pretensão não vos cansar com delongas, meus caros leitores. Admito, faço o mea culpa, pois vejo me excedi nas muitas palavras.

3 comentários:

Anônimo disse...

Isso aí, PC!
Um tema que gosto de discutir!
De fato há uma grande diferença entre Jesus de Nazaré e o Jesus Cristo a que fomos apresentados e estamos acostumados a ver por aí!
Me agradaria muito saber que os escritos de Mr. Dan Brow em "O Código da Vinci" de fato foram verdade! Tornaria tudo mais próximo!!
Abraço!!

Denise disse...

Olá!
Gosto de seu blog e de sua escrita.
Concordo e discordo com seu texto (é possível? :). Bem, discordo que o Código da Vinci seja uma boa obra literária. É um best seller como os do Sidney Sheldon (para mim). A diferença foi usar Cristo para vender. Assim como os pastores (alguns) usam Cristo para venderem lugares no céu, o escritor usou Cristo para vender seu romance de mistério, e obteve êxito. Vale a criatividade, desmerece pela inverdade (minha opinião novamente...).
Vc diz que conseguiram o subsídio do povo com a promessa de que “Ele voltará”.
Sabe, há a opção de se acreditar ou não em Cristo e no que Ele representa. Mas sempre existirá a Bíblia para quem quiser acreditar no que Ele é verdadeiramente. E é na Bíblia que está escrito que Ele voltará, independente de como usam isto.
A angústia humana procura razões diversas, vide o que encontramos hoje (e sempre aliás): diversos credos que prometem salvação (tme gente que manda tomar banho de sal grosso, se pendurar no teto, deitar em facas, etc.)
O lado comercial que usa a fraqueza humana está por todos os lados e é deplorável.
Espero não ter escrito mto e ao mesmo tempo ter me feito entender sem ofensas...
Um abraço, continuarei acompanhando seu blog.
E concordo: livrarias, ainda que com "Código da Vinci" e vinte continuações do mesmo escritor pendurados, é uma passeio mto agradável.
Denise.

Anônimo disse...

Olá PC, grande audacia no texto.

Parabéns!